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Observatório do CARF: tributação dos planos de Stock Option (JOTA)

Observatório do Carf: A tributação dos planos de Stock Option

Por Breno Ferreira Martins Vasconcelos
Advogado. Mestre em Direito Tributário pela PUC-SP. LL.M em Direito Tributário pela Universidade de Bolonha, Itália. Professor do curso de Especialização em Direito Tributário da FGV Direito SP. Ex-Conselheiro da Primeira Seção do CARF.
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Por Daniel Souza Santiago da Silva
Advogado. Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP. Professor no curso de Especialização em Direito Tributário da FGV Direito SP.
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Por Eurico Marcos Diniz de Santi
Professor. Coordenador do NEF/FGV Direito SP. Autor do livro Kafka, Alienação e Deformidades da Legalidade e Diretor do CCiF – Centro de Cidadania Fiscal
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Por Karem Jureidini Dias
Advogada. Mestre e Doutora em Direito. Ex-Conselheira da Primeira Seção do CARF e da Primeira Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais
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Por Susy Gomes Hoffmann
Advogada. Mestre e Doutora em Direito do Estado pela PUC/SP. Conselheira do 3º. Conselho de Contribuintes e depois CARF entre março 2005 até março 2014. Vice-Presidente do CARF entre novembro 2009 até março 2014
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1.INTRODUÇÃO E CONTEXTO DA PESQUISA

Os planos de opção de compra de ações (ou stock option plans) têm sido amplamente adotados visando à retenção de talentos, assegurando a dirigentes e prestadores de serviços o direito de comprar ações da companhia contratante (e, por vezes, de outra empresa do mesmo grupo econômico), após um período de carência e o adimplemento de condições fixadas previamente, mediante pagamento do preço estabelecido no momento da oferta do plano.

Embora exista registro de que os planos de stock option passaram a ser concedidos pelos empregadores brasileiros aos seus dirigentes e prestadores de serviços com ou sem vínculo empregatício entre 1980 e 1990[1], constatamos que essa matéria passou a ser objeto de autuações fiscais tão somente a partir de 2011 e de julgamentos realizados pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”) a partir de 2013.

No CARF, os julgamentos realizados giram em torno da natureza jurídica do stock option, isto é, se, no caso concreto, o plano instituído com fundamento no art. 168, § 3º da Lei das S.A. (Lei nº 6.404/76)[2] tem natureza mercantil ou verdadeira natureza remuneratória, hipótese em que os ganhos se submetem à incidência das contribuições previdenciárias e do IRRF.

Nesse contexto, foram identificados e analisados neste trabalho quinze[3] acórdãos proferidos pela Segunda Seção do CARF sobre o tema, em sessões de julgamento realizadas entre 18/06/2013 e 11/02/2015. A matéria não foi julgada pela Câmara Superior de Recursos Fiscais (“CSRF”) até março de 2015.

Registramos que, para a pesquisa de acórdãos, foram utilizadas as palavras-chave “stock”, “option”, “opção”, “compra”, “ações” e “contribuições”. A busca abrangeu acórdãos publicados no período de 01/01/1990 até 27/01/2016.

2.PERCURSO DA PESQUISA: METODOLOGIA, DELIMITAÇÃO DO OBJETO EMPÍRICO DOS ACÓRDÃOS ANALISADOS, COORDENAÇÃO DO TEMA E COMISSÃO DOS PESQUISADORES AD HOC

O relatório que hoje publicamos (leia a íntegra) é o TERCEIRO de uma série de 21 relatórios temáticos que integrarão o livro “Conselho Administrativo de Recursos Fiscais: Repertório Analítico de Jurisprudência até 2015” e que passaram a ser publicados nesta coluna em sintonia com as futuras pautas de julgamento do CARF.

Os dois principais vetores de orientação dos trabalhos foram promover uma pesquisa imparcial e agregar não apenas números, mas principalmente conteúdo, ao universo de produção acadêmica sobre o CARF.

O percurso nos mostrou que a principal unidade de sentido do coro formado pela voz do CARF é a manifestação de cada conselheiro. Tudo começa e termina pela decisão de um conselheiro do CARF. Daí a preocupação em destacar e identificar, na medida do possível, a voz de cada conselheiro que colaborou na construção do edifício formado pela jurisprudência do CARF.

Sempre que possível, buscamos reunir, nas comissões, pesquisadores com formações profissionais diversas (conselheiros e ex-conselheiros, representantes do fisco e dos contribuintes, advogados, professores e auditores fiscais), o que permitiu a rica contraposição de perspectivas que caracteriza o próprio CARF. O conhecimento prévio da farta jurisprudência do CARF sobre o tema, requisito para a seleção dos autores-pesquisadores, trouxe eficiência à busca e ao agrupamento das decisões.

Além disso, a escolha por relatórios de pesquisa coletivos foi uma proposta de redução de subjetividades.

A pesquisa empírica deste relatório “STOCK OPTION PLANS” foi coordenada por Breno Ferreira Martins Vasconcelos e realizada pela comissão de pesquisadores ad hoc: Alexandre Naoki Nishioka, Carolina W. Landim, Maurício Faro e Roberto Quiroga Mosquera.

A revisão, editoração, inserção de tabelas e conclusões preliminares foram realizadas pela coordenação geral, cuja versão que ora se apresenta para debate público fica, ainda, sujeita à aprovação e validação pela coordenação do tema e pela comissão de pesquisadores.

3.CONCLUSÕES PRELIMINARES DA COORDENAÇÃO DO LIVRO SOBRE A PESQUISA “STOCK OPTION PLANS”, SUJEITAS, AGORA, AO DEBATE, CONTROLE SOCIAL E VALIDAÇÃO PELOS STAKEHOLDERS DO CARF (CONSELHEIROS, RFB, PGFN, CONTRIBUINTES E ADVOGADOS)

Constatamos que em dez dos quinze acórdãos analisados, tendo em vista as características dos casos concretos, os conselheiros concluíram pela natureza remuneratória do plano. Desses dez acórdãos, (i) quatro foram decididos por voto de qualidade[4], (ii) dois por maioria, com um voto divergente[5], (iii) dois por maioria, com dois votos divergentes[6] e (iv) dois por unanimidade[7].

No acórdão nº 2401-003.891 foi dado provimento ao recurso, mas exclusivamente porque a 1ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da Segunda Seção, por unanimidade, discordou do fato gerador eleito pela autoridade fiscal, qual seja, o vencimento do prazo de carência. O voto proferido pela conselheira relatora Elaine Cristina Monteiro e Silva Vieira, contudo, apontou a natureza remuneratória do plano.

Dessa forma, consideramos a existência de quatro acórdãos favoráveis ao contribuinte[8].

Tendo em vista a relevância das características do caso concreto nos casos que envolvem stock option plans, segregamos a análise da jurisprudência em sete critérios, a seguir reportados:

Natureza jurídica: a jurisprudência majoritária (doze dos quinze acórdãos analisados nesta pesquisa) entendeu pela natureza mercantil dos planos de stock option instituídos com fundamento no art. 168, §3º da Lei das S.A., pois envolvem incerteza e risco para o beneficiário. Em apenas três acórdãos prevaleceu o entendimento de que os planos têm essência remuneratória, pois decorrem do contrato de trabalho e são ofertados apenas a dirigentes, empregados e prestadores de serviços sem vínculo empregatício, não sendo disponibilizados a todo o mercado, como ocorreria em uma relação jurídica de natureza mercantil (Acórdão 2301-003.597, sessão de 20/06/2013, Acórdão 2302-003.536, de 03/12/2014; e Acórdão 2301.004.282, sessão de 20/01/2015);

Importância do risco para a caracterização da natureza mercantil: a análise desse critério envolve dois momentos, correspondentes, respectivamente, à aquisição da opção de compra e ao exercício dessa opção. Quanto ao primeiro momento, não há consenso na jurisprudência do CARF sobre a existência de risco nos casos em que as opções são outorgadas, isto é, concedidas gratuitamente ao beneficiário (nos Acórdãos 2401-003.044, sessão de 18/06/2013, 2401-003.045, sessão de 18/06/2013 e 2301-003.597, sessão de 20/06/2013, os conselheiros concluíram que a outorga anula o risco, mas nos acórdãos 2401-003.888, 2401-003.889 e 2401-003.890, todos de 11/02/2015, foi entendido que pode ser suportado risco mesmo nos casos em que as opções foram adquiridas gratuitamente). Já em relação ao segundo momento, o principal aspecto analisado correspondente à discrepância entre o preço de exercício e o preço de mercado das ações, havendo entendimento majoritário de que não há risco nos casos em que são adotadas medidas pela companhia visando a assegurar o ganho do beneficiário;

Fato gerador e base de cálculo: há entendimento majoritário de que, caracterizada a natureza remuneratória do plano, o fato gerador ocorre no momento do exercício da opção de compra de ações, correspondendo a base de cálculo à diferença entre o valor de mercado da ação e o preço de exercício pago. Em apenas um julgamento o CARF entendeu pela ocorrência do fato gerador quando do vencimento do vesting period e adotou como base de cálculo a diferença entre o preço de mercado e o preço de exercício nesse momento (Acórdão 2201-002.685, sessão de 11/02/2015);

Espécie de remuneração: na maioria dos acórdãos em que se entendeu pela natureza remuneratória do plano, foi atribuída a natureza de ganho habitual sob a forma de utilidade, isto é, de remuneração indireta;

Habitualidade/não-eventualidade: é predominante o entendimento de que a habitualidade ou não-eventualidade do SOP é insuficiente para a definição da natureza jurídica do plano, devendo esse aspecto ser analisado em conjunto com as demais características do caso concreto;

Espécie de segurado: a diferença entre segurados empregados e contribuintes individuais foi pouco explorada nos acórdãos, tendo sido identificadas apenas duas decisões nas quais foi registrado que, para definir se as contribuições previdenciárias incidem ou não, deve ser analisado o conceito de salário-de-contribuição aplicável a tais categorias de segurados (Acórdão 2301-004.282, sessão de 20/01/2015 e Acórdão 2401-003.891); e

Reflexos da contabilização: esse critério foi analisado em quatro acórdãos, sendo que em três foi consignado que o simples fato de o Pronunciamento Técnico CPC 10 tratar os ganhos auferidos em SOP como remuneração não é suficiente para afastar a natureza mercantil do plano.

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[1] Cf. voto proferido pelo conselheiro relator Natanael Vieira dos Santos no Acórdão 2301-004.282, de 1º Turma Ordinária da 3ª Câmara da Segunda Seção de Julgamento, sessão de 20/01/2015.

[2] “Art. 168 (…) § 3º O estatuto pode prever que a companhia, dentro do limite de capital autorizado, e de acordo com plano aprovado pela assembléia-geral, outorgue opção de compra de ações a seus administradores ou empregados, ou a pessoas naturais que prestem serviços à companhia ou a sociedade sob seu controle.”

[3] Registramos que parte dos acórdãos identificados envolve o mesmo contribuinte e autuações fiscais semelhantes, relativas apenas a competências diferentes, de modo que as decisões proferidas foram idênticas no que tange à natureza remuneratória ou não dos planos de stock option estabelecidos no caso concreto.

[4] Acórdãos 2401-003.044 e 2401-003.045, de 18/06/2013; 2301-003.597, de 20/06/2013; 2301-004.282, de 20/01/2015.

[5] Acórdãos 2301-004.137 e 2301-004.138, de 10/09/2014, em que o voto divergente foi no sentido de que o julgamento deveria ser convertido em diligência.

[6] Acórdão 2302-003.536, de 03/12/2014 e 2201-002.685, de 11/02/2015, que trata sobre IRRF – Imposto de Renda Retido na Fonte, e não sobre contribuições previdenciárias.

[7] Acórdãos 2402-004.480 e 2402-004.480, de 20/01/2015, em que os votos divergentes tratam exclusivamente sobre o percentual da multa e a definição da base de cálculo, isto é, houve unanimidade quanto à natureza remuneratória.

[8] Acórdãos 2401-003.888, 2401-003.889 e 2401-003.890, de 11/02/2015 e 2803-03.815, de 05/11/2014. Nos quatro casos o recurso voluntário foi provido por maioria, havendo um voto divergente.